sábado, 11 de outubro de 2008

Ela

Rio de Janeiro, 11 de outubro de 2008

Olá,
Pode parecer uma forma estranha de se começar uma carta, mas preciso te dizer. Ceguei o canário que você me deu. Sim, eu me senti uma mulher digna de pena ao final da tortura. Todas as manhãs ele cantava delicadamente, onde os sons deslizavam pela rubra janela de madeira. Mas, essa melodia terminou por tornar-se um martírio crescente. Essas notas me faziam recordar de todas as flores que murcharam em vão, já que você nem rega os meus sorrisos como antes. Aquele pássaro em minha janela pulando descontrolado em sua minúscula gaiola era como a minha voz na garganta. Meu real desejo era matá-lo só que minha covardia foi mais intensa que meu ardor pelo silêncio de camomila. Então, simplesmente dei-lhe a escuridão como presente aveludado. Puni-lo era necessário. Eu precisava que alguém pagasse por minhas manhãs interrompidas pela sua voz em outra garganta. Agora ele gorjeia tristonho em meio às grades enferrujadas e eu adormeço mais serena. Não digo em voz alta, mas sinto sua falta. Lavei e passei sua camisa favorita, ela agora reside em meio aos meus livros mais antigos. Não quero te devolver nada, não posso. Preciso dos seus botões pra terminar meu vestido amarelo. E mesmo que não vá, estarei na mesma livraria de sempre saboreando o aroma dos livros novos e aguardando uma resposta.

Espero que apareça
Ana Luiza

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