sábado, 29 de novembro de 2008

Rio de Janeiro, 29 de novembro de 2008

Tudo bem, se é com desprezo que você me presenteio, abro o presente sorrindo. Não quer me responder, não posso lhe forçar a fazer diferente. Um dia ainda passo na sua porta e jogo ácido nas suas samambaias com aquele verde opaco e sem vida de todos os dias. Entraria no seu quarto irritantemente organizado e arranharia com as minhas próprias unhas vermelhas os seus cd's, queimaria delicadamente todas as suas enciclopédias, desarrumaria seus lençóis alvos e perfumados, pisaria com lama nos pés nos seus travesseiros. Mas, você sabe como eu sou uma covarde imunda que nem passa pela sua avenida, esqueço seu telefone, suas chaves já joguei janela a fora.
Bem, não vou mais te importunar. Vou talvez viajar por um tempo pra qualquer lugar, deixar meus cabelos crescerem, começar um curso de desenho. Vou comprar dezenas de livros, tirar muitas fotos, fazer muitos amigos e nem lembrar que algum dia tive o calor dos seus braços.

domingo, 2 de novembro de 2008

Ela

Rio de Janeiro, 2 de novembro 2008

Olá,
Não posso te perguntar se está bem, pois seria hipócrita demais. Realmente não me importa seu estado de espírito, não hoje. Você sabe muito bem que detesto aquele gato e sabe mais ainda que não vou devolver suas cartas. Estou escutando Paralelas agora. Lembra de quantas vezes a cantei em madrugadas geladas? Provavelmente nem se lembra mais da minha voz, da textura dos meus cabelos, do meu sorriso raro. Tem certos dias que me recordo dos seus dedos desenhando maçãs nas minhas costas nuas. Éramos o pecado em carne, desejo e suor. Fui feliz do seu lado, não contei as horas ou os dias, mas tivemos momentos verdadeiramente bons. Você sempre soube como me fazer serena como uma gata mansa, quase adestrada.
Nossa casa permanece fria, mal iluminada, com meus tão queridos jornalecos espalhados pelo chão imensamente vazio sem seus passos e sapatos mal organizados. Eu roubei um cadarço seu, aquele do seu sapato favorito. Usei-o como laço pra flores mortas que um dia me deste. Elas esfarelam embaixo do meu travesseiro manchando os lençóis frios. Acordo com as mãos molhadas, agora tenho goteiras sob minha mente atormentada. Nada me faz esquecer-te, nem meu calendário vazio, muito menos suas cartas de cobrança. Cansei de te amaldiçoar, volta. Aparece ao menos pra me dar na cara pela última vez. É pouco o que te peço. Ou será que não valho nem um erguer de mãos vazias?

Espero respostas.
Ana Luiza